Canção Sem Nome é o retrato de um passado de dor e atraso do nosso continente, que supostamente foi deixado para trás com a derrubada das ditaduras.

 


De todos os horrores implementados pelas ditaduras militares na América Latina, um que ainda tem suas feridas abertas de forma bem contundente é o sequestro de crianças -  filhos dos opositores mortos em guerrilhas ou em salas de tortura - ou mesmo daquelas famílias muito humildes que não tinham recursos ou possibilidades de erguerem suas vozes na tentativa de recuperar seus bebês, retirados dos braços da mãe ainda no berçário. É sobre essa última condição que “Canção sem Nome” aborda a questão.

Baseados em eventos verídicos, acontecidos durante os anos de chumbo peruano no final dos anos de 1980, o roteiro nos mostra o drama da jovem índia Georgina, muito pobre, que vende batatas em uma feira livre para tirar seu sustento. Grávida e sem recursos para uma clínica particular ou qualquer ajuda profissional para o parto de seu bebê, ela escuta um anúncio na rádio comunitária local de uma clínica gratuita exclusiva para mulheres grávidas. Após o dia de trabalho, Georgina vai até a clínica e é muito bem recebida, e tudo parece funcionar de forma correta. Porém, dias depois, ao dar à luz, o médico leva seu bebê embora, com desculpas pouco convincentes de um berçário mais bem equipado, e no dia seguinte, a clínica e toda a sua equipe, não mais estão no mesmo local.

Desesperada, sem chão, e sem saber o que fazer, Georgina começa a correr em delegacias, ministérios e secretarias, onde é empurrada de um órgão para outro, passando por constrangimentos e humilhações. Até que, em um ato de angústia, entra em uma empresa jornalística e da porta, ao ser barrada, grita por socorro, anunciando o que lhe aconteceu em alto e bom tom, para todos os jornalistas ouvirem.

E aí que ela conhece Pedro, um jovem jornalista, a procura de um caso interessante, que decide investigar o acontecido, e descobre que Georgina é apenas uma de muitas mulheres enganadas que tiverem seu bebês roubados.

Filmado em preto e branco, Canção sem Nome nos remete a uma sociedade fria, receosa e com medo, em um período de crise econômica, violência militar e ataques terroristas, onde milhares de camponeses indígenas fugiam de suas tribos para viverem a margem da civilização peruana. Sem documentos e sem sequer saberem o que é uma identidade, sofriam preconceitos, eram vistos como inconvenientes, e para muitos, o sequestro dos seus filhos poderia ser até vantajoso, visto que uma família mais abastada financeiramente poderia dar tratamento melhor a criança.

É um filme triste, pois trata de uma realidade muito próxima a nós, e mexe com maternidade, com tráfico de crianças, coisas que estão sempre em voga no noticiário, e que sabemos que nada ou muito pouco mudou.  Por tudo isso deve ser visto.

Nota 8,5

Comentários

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

"Sabina K"

Perda, envelhecimento, pouca funcionalidade social.

O Capital