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Mostrando postagens de 2018

Ensiriados (insyriated)

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 A guerra da síria pode produzir situações surreais só comparadas as comunidades do Rio de Janeiro, onde o cidadão tem sua residência fixada exatamente no meio do fogo cruzado, no ponto exato onde duas facções criminosas se confrontam para a tomada do poder, ou onde a própria polícia encontra posição para uma melhor troca de tiros. E no encalço do problema, o direito à proteção da propriedade privada visto mundialmente como fundamental e garantido sem distinção a todos os cidadãos, é abandonado e agredido, gerando as piores consequências. O diretor belga Philippe Van Leeuw escolheu o caminho da metáfora ao filmar duas famílias enclausuradas dentro de um apartamento no meio do fogo cruzado para mostrar a real situação da fragilidade do povo sírio diante do atual conflito: as dificuldades de se refugiar, a impossibilidade da proteção aos incapazes, as violações aos direitos mais básicos do ser humano, e o desespero de não saber se a pessoa querida voltará a ser vista com vida. O roteir

13ª Emenda (13th)

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 Hoje em dia, ao dialogarmos sobre cinema, é inevitável o assunto do forte impacto das atuais exibições via streaming , em especial a NETFLIX, que já conta com mais de 100 milhões de assinantes mundo afora que ainda compartilham senhas e perfis com amigos e familiares. Com todos os prós e contras, a NETFLIX tem uma força comparável com as que tinha as locadoras de VHS nas décadas de 80 e 90, e com o chamariz a mais de que a maior parte da sua arrecadação está sendo utilizada para produções próprias, que vão dos Blockbusters ao cinema alternativo, passando até pelo de garagem.   A questão que surge com impacto é se vale a pena ou não pagar em média trinta reais mensais para ter acesso aos serviços do provedor global mais famoso de filmes e séries. Sempre respondo que vale a pena sim, em especial pelos documentários originais da casa. Independente ou não de você não gostar de séries, assim como eu, ou não achar animador seu conteúdo quase nulo de clássicos do cinema mundial, a NETFL

O Insulto (L'insulte, 2017)

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Contando os altos e baixos e os prós e contras, uma coisa é incontestável nos 13 anos de governo do PT no executivo nacional, a população se dividiu em esquerda e direita, coxinha e mortadela, golpista ou petralha .  Qualquer que seja o modo que você se posicione (ou não se posicione), vão te enquadrar numa dessas categorias. E quando dois indivíduos no extremo dessas posições de encontram, seja numa roda de chope ou em um papo de desconhecidos dentro do transporte público, a coisa ferve, e se não houver aquela turma do “deixa disso”, o bateboca termina em tapas e bofetões. E foi apenas pouco mais de uma década de uma “esquerda” que jamais havia sentado no trono principal de Brasília. Imagina agora um conflito internacional de 70 anos, envolvendo além da política, disputa de território, guerras, terrorismo, e extremismo religioso? É nesse clima de tensões extremas, em um bairro de refugiados libaneses, que um insulto toma proporções gigantescas, e pode inclusiva ameaçar qualquer ac

Proximidades (Tesnota)

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Peculiar e promissor o longametragem de estreia do jovem diretor russo de apenas 27 anos, Kantemir Balagov, que usa como pano de fundo a cidade onde nasceu, Nalchik, capital da República de Kabardino-Balkaria na Federação Russa, historicamente muçulmana, onde no final dos anos de 1990 eram comuns os sequestros de membros das comunidades locais, perigosamente interligadas por questões étnicas e religiosas.  Nesse período turbulento de tensões políticas interna e externa pós desmonte da União Soviética e guerra da Chechênia, jovens têm seus próprios grupos fechados de relacionamento e opiniões. Ilana é uma dessas garotas da região, tem 24 anos e prefere o simples emprego na oficina do próprio pai ao serviço indicado pelo rabino da família, onde ganharia mais, contudo a deixaria mais próxima aos costumes de uma religião que não prioriza. Sua rotina muda quando seu irmão é sequestrado com a noiva na noite do casamento, e a quantia do resgate não pode ser paga pela família, tendo que pe

Sem Deus "Bezbog"

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Ainda que saibamos que estamos rodeados de injustiça e que o sorteio para uma possibilidade de vida harmoniosa e feliz aconteça no berço, ou seja, demande do momento e do local em que entramos nesse mundo; ainda teimamos em crer que podemos mudar destinos e fazer do mundo um lugar melhor de se habitar, mesmo percebendo que as coisas parecem caminhar ao contrário.  Para aqueles que nascem e morrem em locais miseráveis, Sem Deus , a desesperança se faz presente como parte normal realidade. Ali naquela cidade Búlgara isolada, onde o comunismo sugou e não socorreu, e o capitalismo chegou somente na sua forma mais selvagem de corrupção, a população idosa é maioria, o sistema de seguridade social é burocrático e pouco eficaz, e a enfermeira Gana é uma dessas cuidadoras/assistentes que vão de casa em casa prestar ajuda aos mais necessitados, os dementes, os que não tem condições de arcar com seu próprio sustento. Porém a vida de Gana também não é feliz, ela tem problemas com a mãe desempr

Pela Janela

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Rosália é uma sexagenária que trabalha há trinta anos em uma pequena empresa de São Paulo. O dono, que começara com um pequeno trabalho de montagem de peças eletrônicas, conseguira ampliar o negócio a ponto de poder manter algumas dezenas de funcionários que, manualmente, montam fusíveis e outros artefatos descomplicados. A rotina do microcomércio é modificada a partir da sua fusão com uma empresa maior, momento em que Rosália é dispensada da noite para o dia. Sem emprego, com a rotina de três décadas quebradas, a depressão começa a querer das as caras, e a tentativa de consolo vem do irmão mais velho, que deve entregar um carro em Buenos Aires e a convida para acompanha-lo. A partir daí estamos diante de um Road Movie onde a personagem principal começa a viver pequenos prazeres que até semana anterior era improvável, pela carga horária exigida no seu emprego. Cada vento no rosto, cada contato com pessoas diferentes e cada visita a algum ponto turístico, acontece como se fosse um

Em Pedaços "Aus dem Nichts"

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Em tempos de intolerância política e preconceito de classe, onde ao lado da nossa casa o assassinato covarde de Merielle Franco é menosprezado e até mesmo aplaudido, e um pouco além dos muros do nosso quintal o neofascismo é construído com a inércia de grande parte da sociedade, o nosso filme de Fatih Akın cai como uma luva. Descendente direto de turcos, mas nascido na Alemanha, o diretor já sentiu na pele o preconceito e a dificuldade de manter suas tradições em um pais com forte histórico de violência racial. Divido em três partes que poderiam muito bem servir como curta metragens independentes, mas que se completam, o filme toma como prioridade a visão feminina da viúva, que perde o marido e filho de seis anos em uma explosão terrorista em frete ao estabelecimento de trabalho, restando claro que o alvo era realmente as vítimas.  Apesar de quase totalmente linear – com a exceção das poucas passagens de lembranças e saudades da personagem principal – é impossível não voltarmos ao

O Terceiro Assassinato

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Nem sempre a relação entre advogado e cliente é amistosa, muitas das vezes estratégias de defesa não são unânimes, assim como são comuns às discordâncias entre quais testemunhas devem ser arroladas aos autos ou quais tipo de provas materiais podem ser utilizados sem prejudicar o que já foi apresentado no processo. Essa relação se torna mais tensa se o processo resultar em pena de morte ou prisão perpétua, especialmente onde a legislação admite que a confissão do homicídio pelo réu atenua a pena capital para a prisão perpétua. E é exatamente nesse ponto que começa a relação entre o famoso criminalista Shigemori e o acusado de latrocínio Misumi, que apesar de réu confesso, muda à versão do crime a cada visita do advogado.  Com a proximidade  do julgamento, e as investigações feita pelo próprio advogado do réu, diferentes versões do crime e da sua motivação vão surgindo, e a cada dialogo e decisão, velhas questões filosóficas sobre o bem e o mal, criminalidade e ética profissional, sã

A Morte de Stalin

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Poucos estadistas tiveram sua vida tão biografada quanto Stalin, mas a morte do líder soviético ainda está longe de ter um consenso entre os historiadores.   Todavia, sem a pretensão de tomar partido sobre a polêmica da causa mortis, o diretor e roteirista britânico Armando Ianucci lança um olhar cômico sobre as consequências dessa “tragédia” para os camaradas mais próximos ao ditador, e a todos aqueles que de alguma forma tem que lidar pessoalmente com corpo de Stalin, de forma voluntária ou não. E o roteiro se sustenta nas discussões e decisões que devem ser tomadas dali em diante sem a presença daquele que impunha suas vontades a preço de morte daqueles que as discordassem. O pesado jogo do poder ditatorial é atenuado não para fins políticos, mas para o deleite dos espectadores na degustação de cenas onde os poderosos se deparam com situações surreais, mas não inverossímeis, em que a cúpula do poder tem que conseguir alinhar postura autoritária com   o que ainda lhes resta de h

A Ciambra

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O filme se passa em uma comunidade cigana muito pobre, localizada na região da Calábria, ao sul de Nápoles. Nela, o sonho das crianças é crescer para se adentrarem nos grupos de adultos que cometem delitos e passam a falsa imagem de heróis corajosos. O garoto Pio de 14 anos é uma das crianças com idade mais avançada, que fica no limite hierárquico do respeito entre os mais novos e o desdém dos mais velhos. Já fuma, realiza alguns furtos e faz a ponte de contato entre eles e a comunidade de refugiados de Burkina Faso. Aqui, o diretor mostra o preconceito de uma classe baixa a outra ainda mais necessitada, e a tentativa de domina-la. O filme é um relato quase documental da desigualdade social, da repressão do estado, da imigração em massa de quem passa fome, e da eterna segregação étnica, racial, religiosa e cultural que acompanhamos diariamente, inclusive nas redes sociais. Foi exibido na Quinzena dos Realizadores, mostra paralela ao Festival de Cannes de 2017, onde ganhou o prêmio  E