A premiação máxima de Hollywood antenada nas vozes negras e femininas de uma grande geração de artistas, pela frente e por trás das câmeras

Hoje a noite acontece a mais famosa premiação da sétima arte no mundo. Longe de ser a mais justa ou com as melhores produções, é sem dúvida a mais glamorosa e a mais assistida, e a única exibida, mesmo que parcialmente, ao vivo por um canal aberto no nosso país. Todavia, e principalmente para aqueles que veem o cinema apenas como entretenimento, ficar sintonizado nos indicados e vencedores dessa 93° edição do OSCAR é fundamental, pois estão em voga as grandes produções hollywoodianas do ano que atualmente podem ser apreciadas pelos streamings disponíveis aqui no Brasil, na sua esmagadora maioria.

Esse ano a cerimônia conta com dois fatores interessantes, é a primeira vez que duas mulheres concorrem na categoria de melhor direção (Chloé Zhao  por Nomadland e Emerald Fennell  por Bela Vingança), e a quantidade e qualidade das produções feitas por negros com temáticas sobre o racismo jamais foi tão alta. Dito isso, tentarei ser o mais breve possível nas análises para que o texto não fique muito extenso.

Como bom cinéfilo consegui assistir a quase todos os indicados das principais categorias, exceto os longas de animação, que não tenho muita paciência (apesar de compreender sua importância). E também não vi essa continuação do Borat, porque achei o primeiro ruim demais. E não encontrei ainda o tunisiano “O Homem que Vendeu Sua Pele”. De resto, vi tudo.

Como já disse antes, o Oscar está longe de representar os melhores filmes do ano, tanto que ao meu ver o melhor filme do ano passado, o iraniano “Não Há Mal Algum ( Sheytan Vojud Nadarad) não foi sequer indicado, ou mesmo os excelentes estadunidenses “ Estou Pensando em Acabar com Tudo” do Charlie Kaufman e a produção independente mais interessante do ano “Nunca, Raramente, às Vezes, Sempre” da Eliza Hittman, que aqui para nós, dá de 10 a 0 no indicado “Bela Vingança”. Então, provavelmente, meus favoritos não sairão vencedores.

O filme com mais indicações, MANK do David Fincher, é o mais chato de todos os que concorrem na categoria principal. Não é um filme ruim, tecnicamente é um filme muito bem feito. Mas lembra quando a escola de samba Beija Flor ganhou uma edição do carnaval carioca e disseram: "O desfile foi impecável, mas não empolgou”? Então, Mank é um pouco disso, fala sobre burocracias dos estúdios na era ouro de hollywood dos anos 40 e 50, e se você não viveu ou não acompanhou esse momento e não conhece os antigos barões das produções cinematográficas da época, o filme não vai te agradar, mesmo que você ame Cidadão Kane de Orson Wells. Gary Oldman está ótimo, e o som e a fotografia são primorosos. Mas em relação a Fotografia, “Relato dos mundos” é o que mais me fascinou, mas “Nomadland” deve levar esse prêmio nessa categoria.

Falando em “Nomadland”, já fiz a crítica dele aqui no Blog, é um excelente filme, e deve levar alguns prêmios, e é até provável que seja o mais premiado na noite do hoje. Mas para mim, os filmes "dos negros" são os melhores, e vamos a eles.

Não vou falar muito, já que depois pretendo analisar cada um deles por aqui. Mas já vou adiantando que para mim o melhor filme do OSCAR 2021 é “Judas e Messias Negro” do Daniel Kaluuya. O roteiro é tipo o inverso de “Infiltrado na Klan” do Spike Lee em que infiltram um negro na Ku klus klan. Já aqui, o Messias é um negro infiltrado pelo FBI na organização dos Panteras Negras. O filme é sensacional, é quase que uma biografia do líder Fred Hampton dos Panteras. Falando em infiltração, também veremos isso no fantástico “Estados Unidos vs. Billie Holiday” do Lee Daniels, o filme conta de forma magistral os problemas que a cantora de Jazz enfrentou por fazer e cantar uma música que denunciava o linchamento de negros pela população branca dos EUA, e por isso é perseguida cruelmente pelo FBI na tentativa de acabar com sua carreira, mas Billie Holiday é bem mais que um Estado racista com leis conservadoras.

Outro filme espetacular que tem o preconceito de cor como arma é “ A voz suprema do Blues”  do George Wolf, aqui torço muito pela vitória da estonteante Viola Davis, que interpreta a cantora Ma Rainey em uma sessão de gravação supervisionada por brancos em um estúdio de Chicaco. Esse filme, que aparenta simplicidade e é quase todo filmado dentro de um ambiente, tem tanta informação e dá tanto tema para debates, que é obrigatório ser apreciado.

Outro que também segue o estilo de ser filmado quase todo em um ambiente fechado é o ótimo “Uma noite em Miami”, em que narra os acontecimentos do grande encontro secreto entre o músico Sam Cooke (Leslie Odom Jr), o astro da NFL Jim Brown (Aldis Hodge), o ativista político Malcolm X (Kingsley Ben-Adir) e o boxeador Cassius Clay (Eli Goree) em 25 de fevereiro de 1964, alguns dias antes do assassinado do Malcolm, que estava sendo perseguido incessantemente pelo FBI por “incentivar Badernas” em busca do direito dos negros. Atuações impecáveis. Um curta metragem, que faz referência ao covarde caso George Floyd é “Dois Estranhos”  de  Travon Free e Martin Desmond Roe, que fala da incapacidade de um designer negro escapar com vida da abordagem violenta de um policial branco racista e fascita (tipo Jair Bolsonaro). Minha torcida para curta metragem de ficção vai para esse.

A cereja do bolo de toda a premiação do Oscar é a categoria de melhor filme estrangeiro, e é esse ano os filmes são excelentes. Já escrevi aqui sobre dois, deem uma olhada lá, DRUK de Thomas Vinterberg, e COLLECTIVE  de  Alexander Nanau, que também concorre a melhor Documentário. Torço para DRUK, e torço pata Vinterberg que concorre também a melhor Diretor. Aliás, ao meu ver, o dinamarques Thomas Vinterberg é um dos melhores diretores da atualidade e toda sua obra deve ser apreciada.  

Ainda falando sobre melhores filmes da língua estrangeira, o filme bósnio “Quo vadis, Aida?” da Jasmila Žbanić é o mais impactante e forte de todos os concorrentes dessa edição do Oscar, sobre um aterrorizante massacre de civis na pequena cidade de Srebrenica, no leste da Bósnia e Herzegovina em 1995. Obrigatório ser visto.

Roteiro adaptado torço para Tigre Branco, Roteiro Original para Judas e o Messias Negro, atores para um prêmio póstumo a Chadwick Boseman para principal, e coadjuvante para Daniel Kaluuya, ambos de Judas e o Messias Negro. Para as mulheres fico com Viola Davis na categoria principal, na de coadjuvante para sul-coreana Youn Yuh-jung por Minari.

Na categoria dos Curta metragem também tem o lindo "The Present", em que pai e filha atravessam a Faixa de Gaza para comprar uma geladeira de presenta para a mãe. Em curta de animação fico com “If anything happens I love you” 9 minutinhos que no final me fizeram derramar lágrimas, está na Netflix. Documentário, todos fortes e excelentes, fico com "The mole agent", disponível na Globo Play, sobre um velhinho infiltrado em um asilo de idosos para confirmar uma denúncia de maus tratos, lindos demais. E esse texto já está longo demais, acho que ninguém vai ler. Ótima cerimônia do Oscar hoje, mas o mais importante é assistir aos filmes. Mãos à obra no controle remoto.

 

Ps. O filme Brasileiro escolhido para ser selecionado para o Oscar 2021, não ficou entre os finalistas. “Babenco, Alguém Tem que Ouvir o Coração e Dizer: Parou” de Bárbara Paz fala sobre os últimos momentos de vida do marido Hector Babenco (1946-2016). É um lindo filme não só para os fãs do Diretor, mas para quem ama o cinema. Deve ser visto. 

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