Ativista, Sentimental, Feminista, Sonhadora. Filha de Karl Marx.
Nada como o cinema despojado e espontâneo, sem interferência
de magnatas dos grandes estúdios, para
ser livre em nos contar uma história
real. Ao subir os créditos luminosos ao final de Miss Marx, filme da diretora
Italiana Susanna Nicchiarelli que estreou no Festival de Veneza no ano passado, nos deslumbramos somente em tentar visualizar como deve ter sido realizado esse trabalho com atores,
historiadores e equipe técnica que deram vida a história que se passa logo após
a morte do filósofo político Karl Marx: seu legado, e as consequências sofridas
pelos familiares mais próximos por todas as ideias, esboços, sementes e
loucuras espalhadas pela mesa de trabalho, pelas mentes inquietas e pelo resgate
e aprofundamento de seus pensamentos que teriam força de dividir o mundo décadas
mais tarde.
E para focar o expectador no núcleo desse alvoroço político
e cultural, é na figura da filha mais nova de Karl Marx, que vamos adentrar na cinebiografia.
Eleanor Marx, chamada pelo pai de Tussy, acompanhou desde menina os trabalhos
de Karl. Brincava ao lado da mesa enquanto o filósofo escrevia textos que
mudariam o mundo. E mais tarde, além de secretária, virou expoente de suas
ideias e progrediu ainda mais o discurso feminista, saindo mundo afora na
defesa dos direitos dos trabalhadores e na necessidade de lutar pela igualdade
de gênero. Entrava nas grandes indústrias e debatia com homens poderosos a prioridade
das medidas de segurança para os trabalhadores e a sensatez de não colocar crianças
pequenas à frente de maquinários monstruosos para sua condução. E toda essa trajetória,
todo esse discurso, é mostrado de maneira direta, com Eleanor olhando para a
câmera, como se estivesse discursando conosco, se transportando para o nosso tempo
e dizendo que nada ainda mudou, que os trabalhadores continuam em um processo extremo
de exploração, e a grande massa que
precisa ser dona dos meios de produção, ainda é sufocada pelo capitalismo que
age sob o prisma do lucro, em que somente uma ínfima parcela da população
acumula riquezas, enquanto quase toda a sua totalidade vive na pobreza.
E para fazer essa transposição de tempo, ou seja, das
manifestações feitas nas ruas, ou mesmo nas leituras das ideias do pai, até
nosso momento atual de luta, Eleanor conta com toda a versatilidade da bela
atriz Romola Garai, que interpreta uma mulher à frente do seu tempo, e por isso
faz uma interpretação moderna, com uma produção cuja trilha é composta por alto
e bom som de Punk Rock, e que sequer o Hino da Internacional Comunista escapa de
uma versão com batidas e vozes pesadas.
São esses uivos de modernidade cinematográfica que fizeram
uma sincronia a uma história de época e nos trouxe o pensamento tão atual de
Karl Marx. Miss Marx encontra apoio no relacionamento romântico problemático
que Eleonor tem com seu marido, nas contradições desse em ser um excelente
orador das ideias socialistas, mas com um comportamento pródigo que se transforma
em dívidas e problemas com os mais próximos. E é no próprio eixo dessas contradições
que a filha de Marx se espelha para discursar sobre uma Inglaterra que tenta
superar uma sociedade patriarcal, mas continua refém de uma hipocrisia organizada,
onde as mulheres deram um passo gigantesco em direção a igualdade de trabalho,
mas em que na esfera privada ainda estão sujeitas as tiranias dos homens.
E são esses gritos de modernidade com relatos históricos que
dão força a biografia de Eleanor Marx, a faísca que continuou acessa para que
novos ventos expandissem as ideias do gênio Karl.
Nota: 9.0
Belíssima narrativa de uma obra. Atraente, leva o leitor a querer assistir. Clara, espontânea e elucidadora , mostra um redator de excelência e totalmente afinado com o tema. Nota 10.
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